sábado, 7 de maio de 2022

Happy Hour Cultural em Não-Me-Toque: Juntos!

 

Texto: Jana Lauxen.

Fotos: Fernão Duarte, Afobório e Jornal A Folha do Sul.


Era quinta-feira, dia 28 de abril, chovia um monte e nós só pensávamos: será que o tempo seguirá assim amanhã?

Porque “amanhã” era dia 29 de abril e estava marcado o Happy Hour Cultural em Não-Me-Toque, uma promoção do Juntos Coworking e da Editora Os Dez Melhores reunindo mais de 20 artistas locais das mais diferentes áreas para algumas horas de diversão, cultura e reencontro.

Decerto São Pedro ouviu as nossas preces. Afinal, a sexta-feira amanheceu com o sol brilhando e o céu azul, sem uma nuvem sequer – um bom sinal do que estava por vir.


Tudo começou por volta das 17h, quando os artistas começaram a chegar para organizar seus espaços. Muita gente que não se via há anos se reencontrando, muitos abraços e beijos e todas essas coisas lindas e necessárias que só o contato físico nos dá. E que, por tanto tempo, estivemos impedidos de aproveitar.


Cada abraço trazia muito mais do que só um abraço – e olha que um abraço nunca é só um abraço.


Às 18h o evento abriu, o público começou a chegar e, a cada minuto, o Juntos Coworking ficava mais cheio, quentinho e acolhedor.


A Liga dos Heróis logo apareceu, arrancando sorrisos por onde passavam e fazendo a gente voltar a ser criança!


A Liga dos Heróis é um projeto extraordinário que existe desde 2012, capitaneado por Junior Wentz, e que reúne mais de 40 personagens com um só objetivo: exercer um superpoder chamado responsabilidade social. Assim, a Liga marca presença em hospitais, comunidades carentes, escolas e atua na arrecadação de doações. Os heróis também participam de eventos particulares (como festas de aniversário, casamento etc.) a fim de cobrir os custos operacionais do grupo, como fantasias e transporte, uma vez que não contam com qualquer apoio da iniciativa privada ou do poder público.


E preciso chamar a atenção para a excelência das fantasias, os detalhes e os trejeitos, a interpretação de cada artista do herói que representa. É uma experiência que eu espero que você tenha a chance de vivenciar, porque explicar com palavras é insuficiente e deixa muito a desejar.


A banca da Editora Os Dez Melhores trouxe uma série de títulos em promoção, com livros a R$10 e R$20. Interessante sublinhar o interesse da gurizada pelas obras do selo Nascedouro, escritas e ilustradas por crianças também.


O destaque da banca da editora, no entanto, ficou com o nosso último lançamento, a obra Coisas do Interior, do escritor carazinhense Carlos Eduardo Goodman. Quem não conseguiu ir ao lançamento em Carazinho, em fevereiro deste ano, pôde garantir seu exemplar nesta noite – e devidamente autografado, claro!


O sebo Mammalia – Mamíferos que Leem estreou com algumas dezenas de títulos de fazer qualquer mamífero leitor surtar. Apresentando edições restauradas e customizadas, o sebo trouxe desde livros mais recentes até obras dos anos 50 e 60 – sem contar algumas relíquias, como o clássico de bancas de jornal Brigitte Montfort, de 1976; uma edição de 1984 em capa dura do livro Sagarana, de João Guimarães Rosa e os volumes I e II da obra Gente, publicados em 75, de Fernando Sabino, entre outros.


Com preços bem camaradas, Shakespeare, Jorge Luis Borges, João Cabral de Melo Neto, Charles Dickens e toda a turma passearam pelas mãos do público, que ainda trocou aquela ideia massa sobre livros e literatura com o Afobório, o responsável pela banca.


Quem também fez sua estreia foi a artista Elenize Tibola e seu esposo, o escritor Don Eli, ela com suas lindas mandalas e ele com seu segundo livro, Desejos, lançado em 2015 pela Chiado Editora.



Fernão Duarte, lógico, estava lá. Além de fazer a cobertura fotográfica do evento, Fernão apresentou alguns de seus trabalhos com entalhe em madeira, pirografia e também fotografia. O artista levou ainda uma pequena exposição de obras em entalhe de seu pai, o inesquecível Dilon Pias Duarte, que infelizmente perdemos em novembro de 2021, mas que deixa um legado importante e inspirador para a arte e os artistas locais.


Logo ao lado estava a artesã Kênia Alberton, da Classeart, outra velha parceira da Editora Os Dez Melhores que, afora seu trabalho com bordado, crochê e tricô, levou também seus incensos naturais, misturinhas para chimarrão e geleias de morango artesanais (spoiler: são di-vi-nas).


A Carol Zambon trouxe seu trabalho de customização de roupas infantis, a Mini Mim Babys, e deixou todo mundo que tem filho ou sobrinho com os olhos brilhando.


A Schallera Custom Drums não poderia faltar, apresentando seu trabalho de fabricação de caixas e baterias customizadas. Laércio Schallenberg, nosso querido Lars e o responsável pela marca, deu até uma palhinha e de jeito nenhum passou despercebido pelo público.


Nem preciso dizer que a Janaína Bueno e o Elton Augusto, da Jana Artesanatos, estavam lá, pois nossa parceria vem desde que o mundo é mundo. Além de amigos do peito, a Jana e o Elton são praticamente sócios da editora e já estiveram com a gente em tantos projetos, que nem sei contar. 


Como sempre, eles apresentaram seus cuidadosos e detalhados trabalhos em MDF, amigurumis, cuias e artigos para chimarrão, pinturas, decoração e biscuit, desta vez contando com a presença VIP de Elô, que chega na área em breve!


A Tainá Kulba literalmente adocicou a noite com seus docinhos viciantes. Sim, são viciantes. Comeu um e já era. O legal é que, além dos brigadeiros gourmet e bolos caseiros, a Tainá levou também docinhos de bacon. Isso mesmo, você não leu errado, eu disse bacon. Parece estranho? Pois quem comeu não achou e ainda pediu bis.


O bacana do trabalho da Tainá é justamente esta experimentação que ela faz com sabores variados. Em seu cardápio tem brigadeiro de banana, batata doce, limão, hortelã e milho verde, entre muitos, muitos, muitos outros – são mais de 30 opções! Mas lembre-se: viciam. Depois não diga que eu não avisei.


Keli Rahmeier estava lá também, com suas ilustrações cheias de cor e traços característicos, fazendo o que sempre faz: deixando o ambiente mais colorido com os seus desenhos e mais feliz com a sua presença.


Scheíne Trentin levou suas mandalas multicoloridas e distribuiu cores, sorrisos e ideias a quem chegava em sua banca.


A artista e professora Alexandra Braun trouxe os trabalhos de seus alunos do Ateliê Libertarte, apresentando o projeto e o seu resultado, enchendo as paredes com os desenhos da gurizada. E mais: ela levou seus pequenos artistas também, a maioria expondo sua arte pela primeira vez! Uma oportunidade muito especial para as crianças mostrarem suas criações e, principalmente, para nós, que com elas só temos a aprender.


O Jamaica, artista da capoeira, educador, multitalentos e membro da Acanne (Associação de Capoeira Angola Navio Negreiro, no Brasil presente somente em Salvador, Carazinho, Passo Fundo e Poços de Caldas/MG), nos presenteou com arte, conhecimento e cultura suficientes para encher um trem e ainda faltar espaço: em sua apresentação, totalmente interativa, resgatou a musicalidade da cultura preta, de matriz africana, através de cantigas populares que cantam sobre a história do Brasil e de cada brasileiro por uma perspectiva que, costumeiramente, é silenciada.


Seguidas por instrumentos como o tambor e o berimbau, e brincadeiras como o repente e a literatura de cordel, as canções entoadas por Jamaica eram acompanhadas por um público atento, presente e participativo. Olha, foi bonito de ver, viver e sentir.


Jamaica também levou ao evento as bonequinhas Abayomi, que eram confeccionadas pelas mães, nos navios que transportavam escravos, a fim de proteger e acalentar seus filhos. Elas utilizavam um retalho de suas vestimentas e, a partir dele, criavam pequenas bonecas sem costuras, feitas somente com nós. Em suas andanças, oficinas e atividades, Jamaica faz e ensina a fazer as Abayomi, que são entregues como um presente a quem escuta sua história – não por acaso, o significado de Abayomi em iorubá é “encontro precioso”.


Jorje Macedônia, Juliano “Juba” Dengaten e Ronie Dengaten entraram logo em seguida, trazendo aquele rockinho que a gente respeita e sempre faz todo mundo dançar. O trio colocou o Happy Hour Cultural pra cantar junto e o resultado foi um só: festa.


Prego Dartagnan entrou em cena com seus malabares, primeiro com a trilha sonora de Zé Ramalho cantando a magnífica Chão de Giz e, depois, com Jamaica o acompanhando no pandeiro e no caxixi.


Além de impressionar o público com suas habilidades, Prego ainda deu uma letra muito massa sobre seu trabalho e sobre si mesmo. Transparente, conquistou todo mundo na hora.


E já passava das 21h quando a Auto Sugestão começou o seu show, trazendo a fina flor do rock gaúcho na voz e no ritmo de Ronaldo Santos e Rafa MadVision. Só posso dizer que ninguém ficou calado e muito menos parado.


Ah! E não posso me esquecer de citar São Pedro, nosso bróder, que não só ouviu as nossas preces como também participou do Happy Hour Cultural – e participou ativamente, diga-se de passagem. Como eu mencionei no início desta resenha, na semana anterior ao evento choveu praticamente todos os dias, inclusive e principalmente na quinta, dia 28, quando caiu o maior toró. Mas a sexta de manhã chegou ensolarada e agradável, céu azul, limpo e sem nuvens. Quando amanheceu sábado, já chovia horrores outra vez – condição que se estendeu até metade da semana seguinte. Ou seja: a chuva literalmente deu uma trégua exatamente no dia em que mais precisávamos. Obrigada, San Pedrito!


A verdade é que o Happy Hour Cultural nos devolveu um pouco do brilho e do sangue nos olhos, oferecendo a energia e o combustível necessários para seguir em frente e, mais do que seguir, seguir com alguma alegria, apesar de tudo.


Porque se Nietzsche só acreditava em um Deus capaz de dançar, eu só acredito em uma arte capaz de juntar, de conectar, de criar laços, elos e pontes.


Não acredito, nunca acreditei e jamais acreditarei na arte presa em uma redoma de vidro, em cima de um pedestal, inacessível e arrogante. Arte e cultura são direitos fundamentais garantidos pela Constituição federal e não privilégio de meia dúzia. Lugar de arte não é só na galeria. É na rua, na praça, no bar, no centro, na periferia, na festa, no parque. Aqui, aí e ali, em todo lugar.


E, para tanto, não podemos, enquanto artistas, ficar aqui sentados, reclamando e esperando que as pessoas venham até nós. Nós temos que ir até as pessoas. E nós vamos, agora mais do que nunca.


Entretanto, ninguém vai a lugar nenhum sozinho.

Inclusive nós, humanidade, não chegamos até aqui agindo como ilhas. Se nossos antepassados decidissem sair da caverna e se largar sozinhos pelo mundo, não teriam andado 200 metros. Foi em bando que prosperamos e é em bando que seguiremos a prosperar, nos civilizando, nos melhorando e amadurecendo mental e emocionalmente enquanto coletivo. Porque somos coletivo tanto quanto somos indivíduo. E esquecer disso é nos condenar ao fim.


Assim, toda nossa gratidão para cada artista que compareceu e mostrou seu trabalho e talento; que abraçou a ideia e se mobilizou junto para fazer acontecer. Sem vocês, nada haveria.


Todo nosso amor para cada pessoa que passou por lá, que ficou, que trocou uma ideia, que deu e recebeu, levou e deixou, dividiu e multiplicou. Sem vocês, nada haveria.


Máximo respeito e admiração pela Bruna Pellegrini Grams e toda a equipe do Juntos Coworking, pela parceria e por compartilharem conosco não só este espaço fantástico, que a todos acolheu tão bem, mas seu carinho, sua dedicação, seu trabalho duro antes, durante e após o evento. Obrigada pela oportunidade de fazer parte. Sem vocês, nada haveria.


Para a Tata Adiers, essa linda (que, além de linda, é puro carisma), pela cobertura e transmissão do evento através de lives em seu Instagram, que levaram o Happy Hour Cultural até quem não pôde comparecer! A Tata chegou cedo e conversou com todos os artistas, transmitindo também os shows e as apresentações. Quem quiser conferir, acessa: parte 1, parte 2, parte 3, parte 4 e parte 5.


Aos amigos do jornal A Folha do Sul, pela presença, divulgação e registro fotográfico, fica todo nosso afeto e gratidão! A Folha é outra parceira de longa data, sempre dando a nós o espaço e o apoio que só ajudam a seguir adiante.


Não posso não agradecer, com todo meu coração, ao Afobório e ao Fernão Duarte, pelo registro fotográfico da noite. Sem vocês, não teríamos tantas fotos incríveis, que ajudam a voltar no tempo e relembrar o que não pode ser esquecido, colaborando também na divulgação da arte e dos artistas locais! Muito, muito, muito obrigada! Vocês são imprescindíveis e insubstituíveis!


Agora, olhando para trás e ainda embriagada pela energia e pelo movimento deste fim de tarde tão especial, penso que, não por acaso, o primeiro evento que ajudamos a organizar após a crise da pandemia foi em um espaço chamado Juntos.


Juntos. Exatamente o que não ficamos nos últimos dois anos. O próprio Coworking abriu as portas no primeiro ano de pandemia (o contrato de aluguel foi fechado e a pandemia foi decretada poucos dias depois). O Juntos abriu justamente quando deveríamos ficar separados.


E separados ficamos. Mas resistimos, seguimos vivos e cá estamos: o espaço, eu e você, nós. Estamos aqui, apesar das feridas, do desamparo, da revolta, do luto sem fim. Não só sobrevivemos, como, aos poucos, também estamos nos dando ao luxo de voltar a viver e sorrir e cantar e sonhar e – veja só – até abraçar. Estamos voltando a nos dar o luxo de ficar juntos.


Porque, mais do que nunca, temos a absoluta certeza de que, ou nós vamos juntos, ou ninguém vai a lugar nenhum.

Então me dá a sua mão e vem!


Veja mais fotos do evento aqui.